As voltas que o mundo dá, a forma como a terra cobre e
descobre tudo que ocorre, o modo como o tempo se define como senhor de todos os
espaços, é o que me dá a certeza absoluta da Divindade Criadora.
Há uns quatro anos, depois de ter publicado a trágica
história da Família Maluf (e) em nosso amado Distrito, quando as vidas do
distinto senhor Miguel Maluf e de seu jovem filho Salim, foram violentamente
ceifadas de forma covarde e violenta por Emílio Doraciotto, feitor da Estrada
de Ferro Sorocabana, pude mais uma vez fazer tal constatação. Doraciotto
insistia em querer cortar uma árvore que estava no limite das terras da Família
Maluf. Obviamente, Miguel e Salim defenderam sua propriedade, impedindo a
derrubada da árvore. Doraciotto reagiu golpeando pai e filho com uma
ferramenta, assassinando o jovem Salim imediatamente e ferindo gravemente o
senhor Miguel, que veio a falecer um tempo depois no hospital da cidade de
Agudos.
Essa história paira sobre Alfredo Guedes até os dias de
hoje. Há uma reverência constante, prestada às memórias do pai e do filho. Há
uma solidariedade latente, que se estende a todos os seus familiares. Ainda há
lágrimas que choram com Salime, seus filhos e filhas.
Entretanto, nós guedenses de alma, sentimos também
orgulho e honra ao tomarmos ciência do quanto a sua descendência se tornou
valorosa e inteligente. Há um prazer enorme em saber da superação e da
capacidade de ternura que emana de cada sorriso e de cada olhar.
Como eu dizia, depois da publicação da história, há
quatro anos, em uma manhã eu recebi um telefonema em meu trabalho. Era um homem
perguntando por mim. Respondi a ele que eu era quem ele estava procurando. A
resposta dele foi de efeito cambaleante para mim. Ele me disse:
“Meu nome é Gustavo Malufe. Eu sou bisneto de Miguel
Malufe”.
Ele começou a chorar ao telefone e eu mais ainda. Em
soluços eu pensava como aquilo seria possível, depois de tanto tempo? Como
aquela história que eu escutava em minha casa desde muito pequenina, poderia
agora se manifestar através dos familiares de Miguel e Salime?
Numa fração de segundos, todas as imagens das fotografias
que meus avós e minhas tias tinham deles, passavam em minha frente. E eu ouvia
a minha mãe contando tudo de novo. O ano de 1939 me recebia junto dos antigos
protagonistas daquele enredo, que apesar de triste, era também surreal e
poético. Miguel e Salim eram de fato, imortais.
Eu não conseguia alinhar as minhas ideias para falar com
Gustavo. A voz dele desenterrava a imagem e a vida de Miguel. A emoção dele me
mandava de volta para lá, para ver de perto todos os que eu não conhecera. A
respiração dele me fazia vislumbrar dona Salime escrevendo cartas ditadas por
minha avó Lazinha, analfabeta, me permitia sentir o cheiro das sopas que Salime
preparava para ajudar a minha avó alimentar as filhas doentes com a febre do
tifo, e curiosamente Gustavo ganhara um lugar especial nas minhas próprias
histórias familiares, como se estivéssemos todos juntos em dado momento. Para
mim, já era um amigo querido e merecedor de todo o meu repeito.
Gustavo me disse que um primo chamado Charlie, que morava
fora do Brasil havia visto a matéria em meu blog; e que isso despertara a
pergunta “quem é Célia Motta”?
E a Célia somente era a pesquisadora encantada pela saga
de nobre família, apaixonada pelo resgate de memórias. A Célia era a mulher,
que quando menina já escutava essa história no seio de sua própria família, história que consternou o lugarejo para
sempre. A Célia era só isso.
Gustavo me prometera uma visita em Alfredo Guedes e no
nosso Memorial. A partir daí, iniciamos contato constante, exceto no meu
período de saída das redes sociais. Eu não acreditava que podia conversar com o
bisneto de Miguel e com o filho de Adelia.
A
partir daí, eles davam maior riqueza ao meu acervo de imagens e detalhes, me enviando
verdadeiros tesouros. Falar com Gustavo e com Charlie por mais mágico que
fosse, jamais me deu a dimensão do que ainda estava por aflorar.
No
mês de Novembro de 2018, Gustavo entrava em contato comigo novamente para
cumprir o prometido: finalmente a família Maluf estava se preparando para
visitar Alfredo Guedes; e eu, finalmente conheceria as pessoas que davam em
realidade, testemunho e fundamento ao que meu mestre Eduardo Ayres Delamonica
sempre me ensinou sobre o alcance de nossos garimpos de memórias. Eu poderia
externar os sentimentos de toda a minha família Lourenço para os antepassados
da família deles. Eu poderia trazer Miguel e todos os seus à vida outra vez. Eu
poderia trazê-los para o nosso tempo e para o nosso espaço.
Como?
Através
dos descendentes!
Pedi
ao Executivo que os recebesse oficialmente, já que teríamos conosco as
presenças dos filhos de Sahid Maluf, nascido em Alfredo Guedes, jurista
renomado e autor da obra de Direito, Teoria Geral do Estado. Dr. Miguel Alfredo
Malufe Neto (segundo Gustavo, “Migue”l em homenagem ao avô e “Alfredo” em
homenagem a Alfredo Guedes), pai de Gustavo e o responsável pela atualização
das reedições da obra jurídica de Sahid. Maria Regina, Livre Docente em
Psicologia, filha de Sahid e de dona Nagiba (também advogada e poetisa) também
nos daria a delícia de sua presença e de seu sorriso iluminado. E haveria mais:
receberíamos Antonio Carlos Rizeke Malufe, Secretário Adjunto da Casa Civil do
Governo Doria. Uma autoridade do governo estadual, olharia as nossas flores das
praças, caminharia sobre o nosso chão, hoje menos encantado por conta da
ausência de nossos paralelepípedos na rua principal e sobre a plataforma de
nossa estação de trem. A mesma estação que recebeu os passos de seus
antepassados.
E o
Executivo providenciou o devido Cerimonial. Alfredo Guedes bradou os nomes de seus
ilustres filhos em plena euforia.
A
Ordem dos Advogados de Lençóis compareceu no evento, com as presenças do seu
presidente, Dr. Sales e de Dr. Vicente Bento de Oliveira, que foi o primeiro
presidente da OAB em nosso município.
O
jovem neto de Adelia, Ryan, violinista integrante do grupo musical Calidore
String Quartet, foi o responsável pelo discurso da família e pela nostalgia de
sua apresentação de violino. Divino menino!
Cintia
filha de Adelia e mãe de Ryan contagiou o Distrito com sua expressão de
verdadeiro entusiasmo. Seu pai Patrick também marcou fortemente a visita. O
filho de Gustavo, Arthur trazia o vigor de sua juventude para perto de nós.
Charlie,
a quem prezo demais pela distinta consideração e amizade que tem tido comigo
desde que todos nós nos descobrimos, infelizmente ainda não nos deu a honra e a
alegria de sua presença.
Nós
nos falamos sempre, ele me manda notícias de sua mãe e as mais belas imagens de
época de nosso amado lugar.
E
aqui, nesse recôndito de lendas, de memórias doloridas, de lágrimas de
escuridão no romper das noites mais solitárias, retornam todos à antiga casa.
Retornam plenos de gratidão e alegria pelo passar do tempo, pelas
reconstruções, pela preservação da memória. Retornam em sangue renovado, em
comunhão com os novos dias. Com o sol escaldante eles chegaram lindos e
sorridentes, em semeadura de sonhos antigos, em férteis plantios de recomeço.
E a
árvore de Miguel e Salim?
Bem,
a árvore está de volta plantada pelos familiares, com mãos de bênçãos. Crescerá forte e robusta, como uma filha que
ainda será a grande matriarca. Como Salime, a árvore viverá aconchegando
Alfredo Guedes em verde sombra.
E
eu, que sempre seguirei por esses mesmos caminhos, que não sairei daqui nem
depois de meus últimos dias, continuarei esperando pelas próximas visitas. E
sonharei em todas as noites com almas flutuando em nossa Estação de Trem, não
mais com lágrimas de tristeza, mas com olhares de esperança e superação. Pois a
Vida segue juntamente com cada vagão que se vai.Nós nunca morremos, nós nos
transformamos e nos aperfeiçoamos. Miguel e Salim se tornaram imortais e são
agora verdadeiras Lendas Vivas de Amor e Luz.
guardiadelendas.blogspot.com
Célia Motta.
O Prefeito Prado discursando.
Prefeito Prado passando a palavra ao Dr. Miguel Alfredo
Célia Motta na abertura do evento
Impossível não chorar, ao receber das mãos de Cintia, uma pintura original feita e assinada por Dona Adelia
Todos os olhos voltados para a placa comemorativa
Prefeito Prado também recebendo a ilustre família
A placa comemorativa da ilustre visita, para sempre colocada em nosso Memorial
Conversa entre juristas: Dr. Miguel Alfredo, Dr. Sales (presidente da OAB de Lençóis Paulista) e Dr. Vicente Bento de Oliveira (nosso primeiro presidente da OAB de Lençóis Paulista
Gustavo Malufe e Célia Motta
Gustavo, Cristina, Maria Regina, Célia Motta, Cintia, Ryan, Patrick e Arthur
O sorriso de Maria Regina, para sempre será o "nosso" sorriso
O plantio de uma árvore em nosso Distrito de lendas e histórias. Conosco, o secretário de Cultura Marcelo Maganha e Romildo Vera Dias.
Equipe da Secretaria do Distrito, dando suporte ao plantio da árvore da família. Dr. Antonio Carlos, Secretário Adjunto da Casa Civil do Governo Doria nos dando a honra de sua visita
Ryan, Gustavo, Cristina e Arthur: o vigor da juventude entre nós
Momento dos mais emocionantes, Ryan Meehan tocando o seu violino na Igreja do Bom Jesus... e as almas vieram... e os anjos desceram até nós.
A visita tão esperada de Gustavo e sua família, prestigiando o nosso Memorial Alfredo Guedes
Dr. Antonio Carlos, Secretário André Sasso e o Secretário Ticianelli
Dr. Antonio Carlos (sempre muito solicitado) com o Secretário de Cultura, Marcelo Maganha e seu sobrinho Gustavo
Visitante também ilustre, recebendo de Dr. Miguel um exemplar de Teoria Geral do Estado, o Professor e Doutor em História, meu grande amigo Edson Fernandes.